*Em recente postagem, Luiz de Carvalho, do blog Traduções Gratuitas, mencionou elogiosamente O Humanista. O que talvez ele não saiba é que este espaço teve como uma das principais inspirações o próprio Traduções Gratuitas. Cheguei um dia a escrever-lhe um email elogiando seu espaço, mas na última hora desisti, não lembro por que razão. Acho que a melhor forma de retribuir-lhe a lembrança é postando uma de suas traduções.
Mais um rascunho de Lavelle.Convém jamais abandonar a solidão interior. Somente ela aproveita, pois que só ela nos põe em contato com Deus. A outra [solidão] é-lhe apenas imagem muita vez enganosa, fazendo-nos miserável, deixando-nos a olhar para nós mesmos.
No mundo, ninguém fará nada de relevante se não for capaz de juntar em si todas suas forças e encerrar-se na solidão interior – tal como um ovo isolado do exterior por casca impermeável, até ao momento em que, rompendo sua própria casca, dará à luz a uma vida livre e independente.
A vontade de solidão e a de poder semelham-se a dois contrários. Todavia, não há poder que não gere solidão. E a mesma solidão é tão-só desejo dum poder mais perfeito e recôndito.
A solidão é, a seu turno, a marca de nossa força e de nossa fraqueza – de nossa força, quando exerce em nós todas as potências da natureza humana, franqueando-nos a totalidade dos possíveis; de nossa fraqueza, quando nos encerra nos limites do eu particular, revelando-lhe as deficiências.
A solidão faz cada ser concentrar-se sobre as próprias virtualidades. Em se retirando do mundo, parece que carece de tudo. Mas, então, descobre o poder que possuímos de dar-nos tudo a nós – o que é a vida mesma do espírito. As virtualidades nada são se não consentimos pô-las à obra: e é na sociedade dos outros homens que se nos dá exercê-las.
O valor da solidão é o obrigar a pôr-nos em presença do que somos, i. é, do que nos constitui e deve ser distinto de todos acidentes de nossa vida. Não somos uma simples teia de relações: estas manifestam nossas potências, mas, amiúde, as embaraçam.